terça-feira, dezembro 20, 2011

O Escultor morreu há 50 anos

A morte é bicho para sair à rua nos dias que lhe dá na real gana. Quantas vezes injusta, umas rápida de mais, outras cedo de mais, tantas vezes dolente, outras vezes mandada, ali ao virar da esquina numa rua de Alcântara, quem sabe se se anunciou, se pediu primeiro a identificação, se disparou primeiro para o ar antes de se fazer bala certeira, se depois se deixou ser tropeços, pernas bambas, corpo que cai, que se levanta, que torna a cair e se arrasta, e é depois a respiração ofegante - se é que ainda se respira, e depois é o frio (e porquê o frio se o sangue que sai sai quente?) e ganha maturidade de imagem, a morte, assume-se calçada abaixo e fica só, a morte, sem mais nada a acrescentar.

Morrer de morte matada, atocaiado, desumaniza quem mata. Animaliza quem persegue, poetifica quem é encurralado. Num dia assim, de lobos à solta na cidade, há 50 anos, foi assassinado o escultor José Dias Coelho. Homem comunista que não merecia que a morte tivesse sido ordenada por bichos piores, pides, de letra pequena e espinha ainda menor - um e os outros, por razões apostas, merecem perdurar nas memórias do que somos.

Não sei porque é que o Zeca Afonso o lembrou e homenageou como pintor, mas não me lembro de uma homenagem melhor.

"Aqui te afirmamos dente por dente assim / que um dia rirá melhor quem rirá por fim."

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