sábado, janeiro 14, 2012

Ascensão e Queda da Cidade de São Cifrão

Ascensão e Queda da Cidade de São Cifrão, que fui ontem ver ao Teatro Extremo em Almada, é sobre o pior do ser humano.

Ergue-se uma cidade liberal, uma cidade do paga-leva, de whisky, mesa, boxe e cama, uma cidade sem preocupações, uma cidade sem regras, sem leis, de se fazer o que se apetece. É a base do segredo desvendado da felicidade humana! Desde que se tenha dinheiro para pagar...

Em São Cifrão esse é mesmo o pior crime - não ter dinheiro. Crime maior que seduzir, cantar canções alegres ou apostar num amigo que morreria nessa sequência. Crime de morte.

Não conhecendo o original de Brecht, a adaptação do Jorge Feliciano e do Teatro Fórum de Moura é a alegoria da nossa sociedade de consumo rápido, de crédito rápido, de gasto rápido, no sabor férrico do velho oeste de gatilhos rápidos. O enlevo do dinheiro, que nos rodeia, que nos seduz, que nos leva a utilizá-lo sem limites e que depois nos amarra, nos espezinha, nos despreza.
Ascensão e Queda da Cidade de São Cifrão é sobre o pior de nós. É sobre a venda da amizade, a venda da solidariedade, é sobre a venda do amor, a venda do carácter... É sobre hoje, em Portugal e no mundo.

Por isso vale a pena ir ver esta produção. E pela encenação com pormenores deliciosos, pela cenografia do Pedro Penilo, pela qualidade dos actores, dos quais destaco o Luís Mouzinho, e porque ver Brecht "à Brecht" é um prazer raro, nos dias que correm.

Um apontamento para um apontamento: "O Teatro não é só Entretenimento". Não é. Mas não é assim que os nossos governantes encaram o Teatro, a cultura... Ou eles não o encaram de todo - por muitos livros que escreva o secretário de estado e muitas árias que cante o primeiro-ministro no coro. O Teatro Fórum de Moura, que eleva a história e o bom nome da descentralização do teatro, vai sofrer este ano com o desinvestimento na cultura. A maioria dos grupos de teatro, amadores e profissionais, vai sofrer com essa política. Facto que, enquanto agentes teatrais, tem que merecer a nossa solidariedade, amizade e unidade. Para estes governantes, nacionais e globais, Moura, Vila Franca, Almada, ou Tondela, não merecem teatro. Teatro só em Lisboa e no Porto - e esse, só pago.
Como em São Cifrão, curioso...

quinta-feira, janeiro 12, 2012

Comadres zangadas...

Não que se tenha descoberto qualquer verdade relevante, mas a parafernália de notícias acerca das birras da Novo Rumo e do PSD em Vila Franca já enjoa.

A azia não é minha, verdade seja dita, mas deles - dos vereadores da Novo Rumo. N'O Mirante on-line pode ler-se uma notícia (ou uma não-notícia), em que, redundando no tema que levou ao fim do namoro entre PS e PSD na Câmara Municipal, o vereador Rui Rei chama velho ao vereador Alberto Mesquita e este manda o primeiro tomar comprimidos. É digno, sim senhor! Mas de uma cena à Gato Fedorento, do género:
- Ah, o sr. doutor é que é.
- Não não, o sr. doutor é muito mais.
- Ah, assim não vale, que eu disse primeiro.
- Isso não é bem verdade, que eu já tinha dado indicações claras de que iria dizer isso.

Enfim... Mais que a dignidade do momento, que fica com quem o promover, importa reflectir naquilo que me parece ser a táctica do PSD, nas últimas semanas, totalmente dentro do conceito "não importa se falam bem ou mal, importa é que falem de nós". Se, até à retirada de pelouros, a Novo Rumo tinha a maior percentagem de capas d'O Mirante por metro quadrado (bastava ir a uma reunião de CM para aparecer!), granjeando um espaço de auto-promoção não desprezável, após a retirada de pelouros a vontade e, pasme-se, a capacidade de aparecer mantém-se, mesmo à custa de não-notícias como esta.

A Novo Rumo, o PSD e o vereador Rui Rei sabem o que querem, e isso não é mau. Mau é se os leitores d'O Mirante e as populações do concelho de Vila Franca não desmistificarem a sua táctica. Ou se acharem esta atitude interessante. Aí, talvez os vereadores da CDU devessem fazer uma reciclagem em ofensas pessoais e abandonar a crítica política - isso seria pior...


domingo, janeiro 08, 2012

Preparados para sair...

O inefável ministro Miguel Relvas, esse senhor que eu gostava de ver algures entre o Peso Pesado e a Anatomia de Grey, reforçou publicamente o seu gosto por ver os jovens portugueses a "darem novos mundos ao mundo".

Parece que ao conversar com jovens portugueses em Maputo, Moçambique, o ministro, qual Infante D. Henrique, entende que, graças à lusa adaptabilidade, é nossa vocação criar diáspora, sair, descobrir mercados fora dos mercados em que ele, e os seus congovernantes actuais e anteriores, nos enterraram. Diz a sumidade: “Esta é uma emigração muito bem preparada. Nós investimos significativamente nos últimos 20 anos numa geração e hoje não lhes damos aquilo de que eles precisam, que é o emprego”. Não digo, e já o afirmei em posts anteriores, que tenho alguma coisa contra a emigração - a sua concretização por afirmação pessoal do emigrante ou por necessidade, é respeitável e enriquecedora. Mas este incentivo, considerando inclusivamente o investimento que todos nós fizemos nestes jovens, é obsceno.

O governo da nação demite-se de promover o desenvolvimento da coisa. Desperdiça o investimento que realizou, que realizámos, para que estes jovens pudessem ter uma formação que garantisse a Portugal uma sociedade mais capacitada académica, técnica e culturalmente. Manda esse investimento embora, em vez de procurar aproveitá-lo. É triste... Mais triste é ver um governante todo com ar de programa televisivo de por pessoas a não-pensar todo contente por falar com portugueses em Moçambique. Talvez devesse falar mais com os portugueses que queriam construir os seus percursos, as suas vidas, na sua cidade, no seu país, e a quem faltam diariamente as oportunidades. Talvez aí, talvez, deixasse a verborreia de vender paliativos para começar a tratar, de vez, da criação de alternativas aqui, neste lugar em que, feliz ou infelizmente, nascemos e nos construímos.